2018-10-20

E me leve...


O ritmo com que a vida corre!
Mas era suposto correr?
No fim só se morre,
Para quê então correr?

Bate as asas, murmúrio...
Efeito borboleta,
Que transcende mercúrio,
Mesmo que seja treta!

Que batida é esta,
Que amortece,
E já não presta?
Coração que envelhece...

Dizem que a vida é breve.
Porquê então tão pesada,
Esta maldita estrada?
Sendo nada, sendo leve.

E te leve. E me leve....

2018-10-15

Nada de borla!


Queria tanto sonhar o futuro contigo!
Mas não estou optimista, até estou triste.
Tem-me acontecido ultimamente...
Dizem que o futuro é dos indigo,
Mas vejo tudo negro, armas em riste.

Não vejo um mundo de iguais.
Mas um admirável mundo novo,
Que será dos outros que já têm demais,
E nunca pertencerá ao povo?
Talvez seja eu, um  assumido derrotista!
Mas desde que se nasce, é-se egoísta!

Sonhei tantas vezes um futuro melhor,
Baseado na transcendência do amor!
Mas é uma ilusão, um sonho que esvoaça,
Uma fogueira que desaparece em fumaça.
E o mundo corre e tudo passa,
E fica esta desilusão, esta quieta dor.

Talvez tu não vejas como eu, em tons de cinzento.
Mas tens razão, não sou o mesmo, perdi o alento.
E espero que os teus filhos aprendam a morder,
Porque este mundo onde vão crescer,
Nada de borla, lhes vai oferecer!

2018-10-14

O tempo das trevas



Havereis de lamentar,
O deixar passar,
A barbaridade,
Sem verdade!

Lamentareis as vossas filhas violadas,
Rapazes a bater em quem os fez nascer!
As boas ideias sendo abandonadas,
As desigualdades sempre a crescer.

Pensais que não se colhe o que se semeia?
A aranha há-de apanhar-vos na sua teia.
E haveis de sentir a picada do escorpião,
Quando fostes em tretas sem razão!

Oh como alimentais o vulcão ronronante!
Como se prendem os ventos antes do furacão,
Aproximam-se as nuvens negras, clarão trovejante!
E o touro desembolado escarva o chão...

Libertaste o monstro, a besta colossal!
O que fareis, para a conseguir parar?
Quando o mal é bem e o bem é mal?
A mentira que vos há-de sufocar?

Perguntais com hipocrisia:
"Como foi possível o nazismo?
Por nós não aconteceria!"
É a cegueira do populismo.

Entrai no redil ovelhas p'ra matança!
A máquina está afinada, arfando.
Vinde por vosso pé cantando,
Conjurados a esta macabra dança.

Oh não, por mim aos poucos só lamento,
Os males que me traz este meu tempo!
E entrego-vos à idiotice que abraçais,
Que para mim, as trevas, não as quero mais!

2018-10-06

Como os elefantes



Descarrega a areia do teu camião no teu jardim,
Para que seja de areia, um chão,
Deserto assim.
Que esta gente não gosta de flores,
Nem de amores, apenas rancores,
Que coleciona com afinco.
Até transformar tudo em deserto.
E eu com esta gente já não brinco.

Gente de cabeça oca,
Ou apenas cheia de areia,
Como uma ampulheta.
Querem-me calar a boca.
Variam de treta em treta,
A verdade serve-lhes meia,
E são felizes como os ignorantes.
E eu não tenho raízes, como os elefantes.

(a última frase é uma referência ao livro de Romain Gary "Raízes do céu")